Harada Mitsusuke

Harada Mitsusuke

Guardião do Shōtō-kan Tradicional

1928–2021

Harada Mitsusuke em jovem, praticando Karatê.

Juventude e Formação no Japão

Nascido em 16 de novembro de 1928 na cidade de Dairen, antiga colônia japonesa na Manchúria, Harada Mitsusuke cresceu no Japão a partir dos nove anos de idade. Em 1943, com apenas 15 anos, iniciou o treino de Karatê-Dō no lendário Dōjō Shōtō-kan de Tóquio, sob orientação de mestres como Hironishi Genshin e, de maneira direta, do próprio Funakoshi Yoshitaka “Gigo”.

Após o bombardeio que destruiu o dōjō original em 1945, Harada passou a treinar na residência de Funakoshi Gichin, o fundador do Karatê-Dō moderno. Sua formação foi moldada não apenas pela prática rigorosa, mas também pela convivência pessoal com os nomes centrais da tradição Shōtō-kan.

Em 1948, ingressou na Universidade Waseda, onde concluiu seus estudos em Economia e Comércio, alcançando o mestrado em 1953. Durante esse período, treinou com figuras como Egami Shigeru. Em Dezembro de 1956, Harada recebeu o grau de 5º dan. Embora este diploma, emitido com o nome Shotokai e assinado com o selo de Mestre Funakoshi Gichin, tenha sido emitido após o seu falecimento, a atribuição deste 5º dan é amplamente reconhecida como tendo vindo de Egami Shigeru, um ponto crucial para a compreensão da trajetória de Harada.

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A Fundação do Karatê no Brasil e a Continuidade dos Ensinamentos de Harada

Enviado ao Brasil em 1955 pelo Banco América do Sul, Harada passou a residir em São Paulo. Ali, começou a ensinar Karatê-Dō para amigos e colegas de trabalho. Por sugestão de Funakoshi, fundou o Karatê-Dō Shōtō-kan Brasileiro, com sede própria e ensino estruturado — tornando-se um dos primeiros introdutores do Karatê no continente sul-americano.

Seus ensinamentos no Brasil foram pautados pela fidelidade ao espírito não esportivo do Karatê-Dō original, evitando competições e priorizando o desenvolvimento técnico, ético e corporal do praticante.

Apesar da eventual partida de Harada para a Europa em 1963, a continuidade de seus ensinamentos no Brasil se deu de forma distinta do que se poderia esperar. Contrariando a ideia de uma sucessão oficial externa, a verdadeira preservação da prática e dos ensinamentos do Shōtō-kan ortodoxo de Harada em solo brasileiro foi assegurada por seus próprios alunos. Okada Katuo destacou-se como o único a dar prosseguimento direto à prática de todos que Harada havia formado, mantendo viva a essência do Karatê-Dō Shōtō-kan no país. É crucial notar que a organização KDS, desenvolvida por Harada na Europa com base em suas pesquisas e divergências do Shotokai japonês, não teve existência formal no Brasil, reforçando a linha de continuidade autêntica estabelecida por seus alunos diretos.

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A Complexa Origem da KDS: O 5º Dan e a Prática de Egami

A fundação da KDS por Harada Mitsusuke na Europa não foi apenas uma expansão geográfica, mas uma resposta a profundas reflexões sobre a linhagem e a prática do Karatê. O diploma de 5º dan de Harada, emitido em nome de Shotokai e assinado com o selo de Mestre Funakoshi Gichin, porém, com emissão póstuma, gerou questionamentos cruciais sobre a sucessão e a autoridade dentro do estilo. É amplamente aceito que este diploma foi de fato atribuído por Egami Shigeru, o que reforçou a já crescente influência da prática de Egami no desenvolvimento do próprio Karatê de Harada.

Diploma de 5º Dan de Harada Mitsusuke, emitido pelo Shotokai.

Este é o diploma de 5º Dan de Harada Mitsusuke, emitido em Dezembro de 1956 pela organização Nihon Karatê-Dō Shotokai (Sociedade Shotokai de Karatê-Dō do Japão). O certificado ostenta o selo de Mestre Funakoshi Gichin, mas sua emissão ocorreu após o falecimento do próprio Mestre Funakoshi. A verdadeira autorização e o reconhecimento por trás desta graduação são amplamente atribuídos a Egami Shigeru. Esta complexa dinâmica, onde o selo de Mestre Funakoshi e a autoridade de Egami Shigeru/Shotokai (como os detentores das relíquias e do verdadeiro espírito da linhagem) coexistiram, evidencia uma profunda discussão sobre a sucessão e a filosofia que influenciou a fundação e o direcionamento da KDS por Harada.

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Encontro em Avignon e o Conhecimento da Prática de Egami

O contato de Harada com a essência da técnica de Egami Shigeru ocorreu em Avignon, na França, durante um seminário conduzido por Olivier Perroy Sensei. Perroy Sensei era um representante direto de Mestre Egami, enviado para disseminar seus ensinamentos por toda a Europa. Este encontro foi fundamental para moldar a compreensão e a prática do Karatê por Harada, influenciando significativamente sua trajetória antes da fundação da KDS, e solidificando a direção que o Karatê de Harada e, consequentemente, a KDS, tomariam.

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Desenvolvimento da KDS e os Desafios da Disseminação

Apesar de sua diplomação e das orientações de Egami Shigeru, Harada Sensei enfrentou desafios para desenvolver a prática de Egami com total perfeição, pois teve contato limitado com as pesquisas e o aprofundamento contínuo de Egami. Sua própria prática era composta de aproximadamente 90% Karatê Ortodoxo (baseado nos ensinamentos de Hironishi Genshin) e apenas 10% da prática de Egami. Embora tivesse acesso às conclusões, a transmissão eficiente dessas nuances não foi plenamente alcançada. A decisão de nomear sua organização de KDS (Karatê-Dō Shotokai) foi fortemente influenciada tanto por sua graduação de 5º dan, pelo nome Shotokai presente em seu diploma, quanto pelas diretrizes de Egami.

Harada esteve envolvido na divulgação do Karatê de Egami através de outras pessoas. Entre elas, Tetsuji Murakami Sensei, que viajava ao Japão para observar e fotografar a prática, mas não a praticava efetivamente com Egami. A visão de Aoki Hiroyuki o levou ao desenvolvimento do Shintaido, que não é Karatê, e essa visão influenciou a busca de Murakami por um Sōgō Budō (Budo Completo ou Budo Integrado).

As insistentes solicitações de Harada para que Egami aceitasse Murakami como representante na Europa e o promovesse a 5º dan Shotokai geraram alguns problemas. Isso porque Egami havia recebido William Schneider como um filho no Karatê. Schneider havia praticado intensamente e adquirido o 5º dan por sua dedicação na Universidade de Gakushūin (a Universidade do Imperador) em Chūō, e especialmente no Dōjō de Egami, onde sua prática era sem as restrições universitárias ou do Dōjō Shōtō-kan. Por esse motivo, Harada não queria que Schneider continuasse a ir ao Japão, mas essa solicitação foi rejeitada tanto por Egami quanto por Schneider. É importante notar que Egami aceitou parcialmente a prática “mais branda” devido às restrições quanto a alunos machucados tanto no Hombu como nas universidades, e à constante e desagradável circunstância de chamarem o Karatê de “a arte de fazer assassinos”, uma ideia que ele considerava totalmente inaceitável. Para Egami, o caminho do Karatê era, acima de tudo, um caminho de Paz ou Heiho.

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Honrarias e Legado

Em 2007, foi condecorado pela Rainha Elizabeth II com a honraria de Member of the British Empire (MBE), por sua contribuição ao Karatê no Reino Unido. Publicou, com o auxílio de Clive Layton, a obra Karate Master: The Life and Times of Harada Mitsusuke, hoje referência biográfica no meio.

Harada faleceu em 26 de fevereiro de 2021, aos 92 anos, no País de Gales. Seu legado permanece vivo nos dōjōs do mundo que seguem a via tradicional do Shōtō-kan — onde o corpo, a mente e o espírito se alinham em busca de algo maior do que a mera vitória.

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Linhagens no Brasil: Shōtō-kan Ortodoxo de Harada e a Prática de Egami

No Brasil, a continuidade do Shōtō-kan ortodoxo de Harada Mitsusuke foi primariamente mantida por seus alunos diretos, com destaque para Okada Katuo. Okada Sensei dedicou-se a preservar e transmitir os ensinamentos originais de Harada, fundamentados na tradição do Shōtō-kan, sem as modificações posteriores ou a influência da KDS que se desenvolveu na Europa.

Paralelamente, a verdadeira prática do Karatê de Egami Shigeru começou a ser disseminada no Brasil através de Filié Sensei. Antes de se aprofundar nos ensinamentos de Egami, Filié Sensei estudou por anos o Karatê de Harada com Okada Katuo, alcançando a faixa castanha nessa linhagem. Posteriormente, Filié Sensei foi graduado Shodan e Nidan por Schneider William, que era um expoente da prática de Egami, solidificando a introdução e o desenvolvimento dos princípios dessa vertente no cenário do Karatê brasileiro.

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